Mensagens de Marcola, líder do PCC, encontradas com mulher de colega de cela ordenavam morte de autoridades em caso de transferência
Líder do Primeiro Comando da Capital (PCC), Marcos Willians Herbas Camacho, o Marcola, alegou “violação de intimidade” após a apreensão de cartas enviadas por ele a integrantes da facção fora do presídio de Presidente Venceslau (SP), onde estava preso. Nas mensagens codificadas, encontradas com a mulher de um colega de cela, Marcola ordenava o assassinato de autoridades caso fosse transferido para um presídio federal.
As 5 cartas escritas à mão foram interceptadas no dia 8 de dezembro de 2018, na rodovia Raposo Tavares, nas proximidades do presídio de Presidente Venceslau. Elas estavam com Maria Eliane de Oliveira e Alessandra Cristina Vieira, que haviam acabado de deixar a penitenciária em um carro. “Maria Eliane de Oliveira e Alessandra Cristina Vieira foram detidas por transportar bilhetes e anotações contendo fragmentos de conversas vinculadas ao tráfico de drogas e organização criminosa”, diz o inquérito obtido pela coluna.
“A partir de informações constantes em banco de dados, policiais civis analistas trabalharam nos fragmentos codificados, extraindo tradução que corresponde à autorização de um suposto plano para assassinato de autoridades públicas, sendo uma autoridade de Presidente Venceslau e outra de cidade maior, com a informação de que a missão deve ser cumprida caso se concretize a transferência, para presídio federal, do autor intelectual da missiva”, relatou a Polícia Civil.
Em sua defesa, Marcola pede agora a anulação das provas encontradas. O argumento é que os policiais que fizeram a revista não tinham mandado de busca e apreensão e teriam cometido “violação de intimidade”. Nesse caso específico, o líder do PCC foi condenado a 12 anos de prisão em regime fechado.
As investigações da Polícia Civil de São Paulo mostraram que Alessandra Cristina era namorada de Mauro César dos Santos Silva, colega de cela de Marcola. Por sua vez, Maria Eliane era mulher de Júlio César Figueira, o Taison, também integrante do PCC. Dessa forma, as mensagens foram relacionadas a Marcola, que estava na iminência de ser transferido para o Sistema Penitenciário Federal (SPF), após a descoberta de um plano para resgatar o traficante.
“Avançando nas investigações, apurou-se que Alessandra Cristina Vieira esteve em visita, quando da prisão, ao seu amásio Mauro César dos Santos Silva, que ocupa a mesma cela de Marcos Willians Herbas Camacho, fatos que, em tese, podem tipificar crime de integrar organização criminosa e ameaça”, alegou a Polícia Civil.
Um dos alvos do plano de assassinato descoberto nas mensagens seria o promotor de Justiça Lincoln Gakiya, do Grupo de Atuação Especial de Combate ao Crime Organizado (Gaeco) do Ministério Público de São Paulo, em Presidente Prudente, autor do pedido de transferência de Marcola. A outra vítima seria o coordenador da Coordenadoria Regional dos Presídios da Região Oeste de São Paulo, “responsável pela equipe de inteligência que descobriu o plano de resgate das lideranças reclusas na Penitenciária II de Presidente Venceslau”.
“Nesse contexto, por ocasião da visita, por ordem de Marco Willians, os presos Mauro César e Júlio César repassaram às suas respectivas companheiras diversas anotações, das quais se destacam duas que estavam codificadas. A análise e a decodificação das cartas apreendidas evidenciaram ordem para os assassinatos do Dr. Lincoln Gakiya, promotor de Justiça responsável pelo requerimento de transferência, e do coordenador da CROESTE”, afirmou a denúncia do MPSP.
“Os bilhetes apreendidos deixam claro que a organização criminosa, por ordem de seu líder Marco Willians, valendo-se da fundamental participação de Mauro César, Júlio César, Alessandra e Maria Eliane, agiu em retaliação aos pedidos de transferência e isolamento de seus líderes, disparando ordens para que outros integrantes passassem a coordenar o plano já em andamento para o assassinato do promotor de Justiça e do coordenador da SAP”, avaliou o Ministério Público.
Defesa
Em sua defesa, o líder do PCC pediu a anulação das provas encontradas com as duas mulheres em dezembro de 2018.
“O recorrente [Marcola] apresentou preliminar de nulidade ‘da prova decorrente da abordagem policial ter sido motivada apenas pelo nervosismo das acusadas Maria e Alessandra, resultando, assim, em ausência de demonstração da fundada suspeita, não merece acolhida’”, diz a ministra do Superior Tribunal de Justiça (STJ) Daniela Teixeira, relatora de um recurso de Marcola contra a sentença.
Para a magistrada, as alegações da defesa de Marcola não conseguiram provar “a ausência de justa causa a justificar a diligência onde se teria encontrado um bilhete cuja autoria ou interesse teria sido atribuído ao ora recorrente, fundamento utilizado para justificar a legalidade da violação do direito constitucional da intimidade”.
Mensagens
Nas mensagens encontradas com as duas mulheres, além do plano de assassinato de autoridades envolvidas na transferência de Marcola, havia detalhes sobre as negociações do PCC para o tráfico de drogas.
“Os documentos foram escritos de próprio punho e contemplam várias informações referentes ao crime organizado e à movimentação de drogas. Ademais, insta ressaltar, a título ilustrativo, que entre os manuscritos foram localizados termos como quilos e valores numéricos em reais, pavilhões e seus responsáveis — termos usados para designar pagamentos e valores arrecadados pela venda de drogas vinculada ao comando do crime organizado”, afirmou o delegado responsável pelo inquérito da Polícia Civil, Adalberto Gonini Junior.
“Eis que as autuadas Maria Eliane de Oliveira e Alessandra Cristina Vieira, por estarem saindo com essas escritas codificadas do presídio que abriga a cúpula do PCC, com absoluta certeza, são integrantes do crime organizado e, com essa colaboração, signatárias de informações em códigos, promovem ou ajudam a promover as barbáries que estamos acompanhando todos os dias nos noticiários, praticadas por esta e outras organizações criminosas […] sendo ambas responsáveis por alimentar o crime organizado com informações referentes aos lucros auferidos com o tráfico de drogas e informações preciosas para a manutenção financeira do grupo criminoso organizado”, argumentou o delegado.
Em 2022, Maria Eliane e Alessandra Cristina foram condenadas pelo juiz Deyvison Heberth dos Reis, da 3ª Vara do Fórum da Comarca de Presidente Venceslau, pelo crime de associação criminosa, a 4 anos e 6 meses de prisão em regime semiaberto. Júlio César Figueira recebeu pena de 7 anos e 10 meses em regime fechado e Mauro Cesar, de 8 anos e 9 meses. Assim como Marcola, eles também tiveram recursos negados pelo STJ em fevereiro deste ano.
Metrópoles