Início INTERNACIONAL Peru enfrenta explosão de gangues e declara situação de emergência

Peru enfrenta explosão de gangues e declara situação de emergência

A medida foi tomada após o assassinato do cantor Paulo Flores, de 40 anos, morto a tiros no ônibus da banda “Armonía 10”.


O governo do Peru decretou na noite de domingo, 16, estado de emergência na província de Lima e de Callao autorizando que as Forças Armadas atuem em conjunto com a polícia no combate contra gangues que causaram uma onda de extorsões no país. A medida foi tomada após o assassinato do cantor Paulo Flores, de 40 anos, morto a tiros no ônibus da banda “Armonía 10” após uma apresentação em San Juan de Lurigancho, no leste da capital.

Conforme as testemunhas, Flores foi executado com dois tiros por sicários, como são chamados os assassinos ligados a gangues dos países latino-americanos. O crime provocou indignação no Peru e elevou a pressão sobre o governo de Dina Boluarte, que conta com apenas 3% de aprovação, segundo uma pesquisa divulgada em dezembro.

“Foi decidido que, nas próximas horas, será decretado estado de emergência em toda a província de Lima e na Província Constitucional de Callao, com o deslocamento de tropas das nossas Forças Armadas em apoio à Polícia Nacional”, anunciou Gustavo Adrianzén, chefe do gabinete ministerial do Peru.

De acordo com membros da Armonía 10, os integrantes do grupo vinham sendo extorquidos por criminosos que exigiam grandes quantias de dinheiro para que o grupo continuasse a se apresentar. A morte do cantor não foi o primeiro atentado ocorrido contra a banda, já que em dezembro, o ônibus do conjunto foi atingido por disparos em Callao. Outros músicos peruanos também relataram que eram alvos de tentativas de extorsão.

Segundo dados compilados pela ONG CSHA (Capital Humano e Social Alternativo), atividades criminosas movimentaram 9,8 bilhões de dólares no Peru em 2023. O garimpo ilegal de ouro é a maior atividade criminosa, com 4 bilhões de dólares. Conforme a pesquisa, a prática de extorsão movimentou 758 milhões de dólares no período.

Onda de extorsões

Em 2024, autoridades policiais do Peru receberam mais de 18 mil denúncias de extorsão em todo o país, bem acima dos 4.500 casos documentados em 2021. No entanto, analistas alertam que a grande maioria dos casos não é denunciada devido ao medo de retaliação.

Uma pesquisa divulgada pelo IEP (Instituto de Estudos Peruanos) em janeiro estimou que 20% dos peruanos já foram vítimas de extorsão. Em números absolutos, pequenos comerciantes são o grupo mais afetado. Uma associação de escolas e colégios particulares apontou que mais de 300 instituições de ensino do país foram alvos da mesma prática criminosa no ano passado e que o número nos dois primeiros meses de 2025 já ultrapassa 400.

Motoristas de ônibus do descentralizado setor de transportes, caracterizado por centenas de pequenas empresas, também são alvos frequentes por lidarem com dinheiro vivo. “Antes vivíamos em paz, mas agora estamos arriscando nossas vidas apenas indo ao trabalho”, afirmou o condutor José León, de 63 anos, ao jornal “Financial Times” em janeiro. “Se você não pagar, eles te matam”, completou, acrescentando que boa parte do seu salário tem sido direcionado para pagar gangues.

Segundo analistas, gangues e grupos do crime organizado que antes se dedicavam a outras atividades, como tráfico de drogas, passaram nos últimos anos a se concentrar na extorsão. “A extorsão fornece aos grupos do crime organizado algo de que eles mais precisam: fluxo de caixa”, apontou Ricardo Valdes, ex-vice-ministro do Interior do Peru em entrevista ao FT.

Organizações estrangeiras

A crise de extorsão também coincidiu com a expansão da presença no Peru de grupos criminosos internacionais, notadamente da Venezuela, da Colômbia e do Equador, que se aproveitaram do vácuo deixado pela crise política que afeta o Peru há quase uma década.

Conforme o site “Infobae”, a polícia peruana estimou em 2023 que máfias estrangeiras operavam em pelo menos 16 dos 43 distritos de Lima. Ainda de acordo com as autoridades, entre 2019 e 2023, mais de 2.000 pessoas foram presas por extorsão no país, das quais cerca de 300 vinham do exterior.

Entre esses grupos está o venezuelano Tren de Aragua, que recentemente ganhou destaque após o presidente americano Donald Trump determinar a deportação de 238 acusados de pertencerem à organização criminosa para prisões em El Salvador. Na semana passada, o Congresso peruano passou a designar o grupo como uma “organização terrorista”, seguindo o exemplo dos EUA.

Debilidades do Estado

Analistas apontam que a crônica fraqueza dos governos peruanos na última década criou um cenário propício para as gangues e ineficiência das autoridades. Desde 2016, o país já teve seis diferentes presidentes e quatro ex-mandatários foram presos na última década.

No momento, a Presidência é ocupada por Dina Boluarte, que assumiu o cargo em 2022, após o antecessor, Pedro Castillo, ser destituído na esteira de uma tentativa de autogolpe.

Em setembro, mais de 20 associações empresariais do Peru denunciaram que o país estava “perdendo a batalha” para o crime organizado. “Vivemos sob o cerco do crime organizado, que assumiu o controle do país na ausência alarmante do Estado”, disseram as associações em uma declaração conjunta.

Em 2024, o orçamento do Ministério do Interior, responsável pela polícia, foi de apenas 3 bilhões de dólares, e o do Ministério da Defesa, 2,3 bilhões.

Portal SGC

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